segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Cotidiano Fantástico #6 - Perspectiva

No tempo em que as paradas de ônibus eram lajedos de concreto, Maurício pré-concebia uma mudança de perspectiva na sua vida. É fato que o demasiado sucesso dos ninjas, assassinos do Japão feudal, se baseia, dentre outras características, no fato de que os seres humanos tem uma incapacidade natural de olharem para cima e admirar o que por ventura esteja a caminho de acertar suas cabeças. A cultura de “olhar para o chão evitando cair em algum possível buraco” declinou nossa habilidade de usar da visão periférica e calculo mental para permanecer atento na área que consiste no “acima de nossa cachola”.

No entanto, Maurício, perdia um tempo considerável admirando essa área visual pouco explorada. Durante seus momentos de inércia, perdia-se em pensamentos sobre teias de aranha no canto da sala, princípio de infiltrações no teto, o formato das nuvens no céu, a luz fluorescente e os mosquitos que a rodeavam. Evitava ao máximo olhar diretamente para frente, escolhia sempre um ângulo que desse para perceber ao menos o movimento ilusório dos prédios enquanto se deslocava pela rua, e intrigava-o o fato da solidão do concreto armado no meio da selva de pedra, e de sua própria solidão em meio a vida selvagem.

O combo de sempre era o que atingia Maurício, não gostava do seu trabalho e de qualquer forma estava prestes a ser demitido mesmo, as contas do seu apartamento alugado o consumiam demasiadamente e sofria desilusões amorosas que o perseguiam nas noites de solidão. Enfim que um dia surtou, ao voltar do trabalho lá pelas tantas da noite, decidiu que não queria mais viver a vida do chão e inverteu a perspectiva, escalou o ponto de ônibus e fez do teto da parada sua cama naquela noite fria, junto a poeira da fumaça impregnada no concreto e as culturas de musgo que se protuberavam.

Na manhã do dia seguinte, se espantou Maurício por não terem interrompido seu sono acusando-o de loucura e mandando ele descer da parada. Ficou por lá, admirando a nova vista de cima. Como era lógica a solução de todos os problemas da humanidade, só um olhar de cima e poderia realizar filosoficamente a felicidade de estar um pouco mais perto do céu. Ao menos uma coisa passava a incomodar essa lógica aérea de Maurício, sua imperceptível estada na nova morada era inconcebível, ninguém parecia perceber que havia um homem vivendo encima da parada de ônibus, o que já era natural para os que andam apressados olhando para o chão, mas existiam os passageiros dos ônibus, os moradores de apartamentos, as pessoas que o olhavam de cima estavam tão presos ao chão que não percebiam ou não viam nada de anormal encima do ponto, por mais que Maurício tentasse chamar alguma atenção parecia invisível para os demais.

Apesar de tudo, conseguia constituir uma vida minimalista no teto de concreto, sem luxos e sem exageros, apenas a boa ventura de desligar-se das aflições da realidade. De comer servia o musgo que crescia rapidamente nas bordas do concreto, de beber servia a agua das chuvas que ficava encalhada encimada parada, o excremento não era problema, pouco e inodoro devido a dieta de musgo que comia, jogava direto no caminhão de lixo que passava e urinava na rua mesmo quando ninguém estava olhando.

A vida era perfeita, e aos poucos Maurício foi descobrindo os segredos dessa nova estadia. Descobriu que a mesma regra da invisibilidade encima das paradas servia encima dos ônibus, então aproveitava um bom tempo de seu dia vislumbrando a paisagem de cima dos coletivos. Visitava outra paradas e ocasionalmente dormia fora para renovar os ares, acabou assim por descobrir que não estava sozinho, numa dessas viagens nos circulares da vida encontrou Cláudia, publicitária de 23 anos que desistiu do curso para explorar novas fronteiras, Alberto, que a 15 anos morava no teto de uma barraca e viajava entre as paradas de todo o estado encima dos ônibus interestaduais, e conheceu mais uma diversidade de pessoas que constituíam essa comunidade da “nova perspectiva” e se encontravam encima dos ônibus ocasionalmente.

Tudo parecia uma vida de liberdade e desapego material, eram novos “hipies” se fosse comparar bem seus estilos de vida. Até que uma dessas noites Maurício dormia no aconchego de sua lage fria e suja, mas sentiu um incomodo subconsciente vindo de seus sonhos, pesadelos de que havia uma multidão puxando seus pés para baixo, raivosa e sedenta, querendo desapropria-lo do espaço que conquistara, puxando seus sapatos com tanta força que ele não conseguia se segurar.

Acordou! Ofegante e suado, Maurício percebeu que havia sim, alguem puxando seus sapatos. Um Anjo loiro e fiel aos esteriótipos, com asas longas de penugem branca, caía para trás após conseguir retirar o par de sapatos dos pés de Maurício.

- Mas...o que é isso! Quem é você – disse Maurício.

- Quem eu sou não importa! Eu vim cobrar o aluguel! - Disse o anjo se protegendo com sua asa direita.

- Peraí, mas que aluguel !? Isso é um absurdo ! Eu vivo aqui já faz um tempo e nunca ouvi falar de aluguel nenhum! - Gritou Maurício revoltado com o novo fato.

- É semestral...nova regra...espaço privilégiado tem que pagar aluguel, senão será desapropriado. - disse o Anjo fazendo menção de voar.

- Mas o que !? Isso é loucura ! Eu não vou a lugar algum, nem vou pagar aluguel pra ninguém, tá me ouvindo!? -

- Faça como quiser...mas é melhor arranjar um trabalho quiser ficar por aqui. - Dito isso o Anjo saiu voando e desapareceu na noite fria.

Meses depois, as paradas de concreto foram consideradas demasiadamente perigosas, e foram demolidas, dando lugar as paradas de metal, inofensivas, bonitinhas e inabitáveis, visto que os moradores das antigas não pagaram o aluguel do empreendimento da “nova perspectiva”. Maurício e tantos outros nunca mais foram vistos no chão novamente.

domingo, 14 de novembro de 2010

Cotidiano Fantástico #5 - Rosa

Ruth não estava presente em seu corpo naquele momento. Embora seus batimentos cardíacos, respiração e pupilas cansadas indicassem totalmente o contrário, as funções cerebrais de Ruth não agiam de forma a corresponder sua presença dentre os terráqueos. Olhava o fim do túnel. Sempre a luz branca no fim do túnel, esse em particular era branco por todos os lados, Branco!

Ruth gostava de cinza, mas suas amigas gostavam de branco, uma segunda pele para combinar no dia-a-dia com a primeira pele branca que usava para dormir, para tomar banho, para fazer sexo. Esse ultimo item não ocorria com a frequência desejada, por que Ruth era branca! Na comida, na fala e no sorriso; Insípida, uma cor neutra para não ser questionada , era a justiça, a calma, a assepsia e no fim a esperança da morte.

Era tão incomum para ela o rumo caótico que tomavam seus pensamentos que, por algum motivo, nunca tinha na vida imaginado como seria prazeroso levar uma metralhadora para lavanderia e deixar que os músculos de seu dedo indicador se contraíssem livremente, deixando o cheiro de sabão em pó e amaciante esconder o vermelho sangue voando pelo ar e tingindo as roupas de...

Ruth acordou do transe derrubando o alvejante azul no chão, o tubo hipnótico girava gradativamente mudando de cor enquanto ela tentava desligar a máquina no meio do processo de enxague. Clarice, amiga de Ruth, ajudava a tirar as roupas brancas que sobraram, tentando reaver um lenço vermelho que tinha esquecido na lavagem anterior.


Quando Ruth foi trabalhar no dia seguinte não havia saída, era uma blusa rosa por cima da última blusa branca que havia sobrevivido ao lenço vermelho de Clarice, um jeans tanto quanto usado e um tênis (gostava de usar tênis). Na saída do trabalho foi numa lanchonete e comprou um café, sentiu aquela vontade de chorar que sempre emergia no fim da tarde, mas segurou a postura por que o cara da outra mesa a estava observado:

- Bonita blusa, combina com sua pele...- Ele pareceu ter reunido muita coragem para fazer aquela observação...

- Obrigada – Ela reuniu muita coragem para não ignora-lo.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Cotidiano Fantástico #4 - Atmosfera

Juliete acordou. Estava deitada sobre uma camada espessa de poeira fina, notou esse detalhe logo após os 5 segundos que seus sentidos levaram para tomar as rédeas da situação. Sentia-se leve, leve como nunca, de dentro pra fora a paz fluía como se fosse vento, embora não houvesse nenhum sinal de qualquer movimentação atmosférica a sua volta. Pensou em não levantar-se, como sempre pensava depois de acordar, com seu lençol em volta das pernas e o travesseiro entre seus braços, era comum relutar em enfrentar o inexorável destino do dia, mas nesse caso em específico, não sentiu o lençol entre suas pernas, nem travesseiro entre seus braços, apenas frio na superfície que seu corpo repousava, e poeira.

Decidiu então tomar um voto de coragem e levantar-se enfim, devia estar realmente entorpecida pelo sono, porque sua reação inicial foi demasiadamente calma para alguem que acaba de perceber estar em um lugar completamente diferente de onde dormiu na noite anterior, uma vastidão cinza e escura, com algumas protuberâncias esquisitas no horizonte, pelo jeito ainda era noite, o céu escuro se estendia por todos os lados e indiferentemente acima, repousava uma meia circunferência, grande, distante e azul, que se chamava Terra.

Por mais que essa informação parecesse perturbadora, na perspectiva de Juliete era incrivelmente calmante, estava sonhando enfim, um sonho extremamente consciente que seu cérebro as vezes titubeava e achava mais real do que logicamente era possível, então dava um passo, outro e mais outro, pegava embalo para um grande salto e ficava solta pelo ar, desfrutando da sensação de liberdade que a baixa gravidade imprimia em seu corpo. Só num sonho poderia se sentir tão bem, era o terceiro elemento que a fazia deixar de lado a possibilidade de acordar, o sonho era uma narrativa perfeita por ser tão fantástica e não depender de outras pessoas para acontecer, apenas de suas projeções. No sonho tudo é reversível, ninguém precisa de motivação e pode se fazer o que der na telha sem esperar julgamentos, então Juliete pulava para sentir aquela sensação gostosa de vertigem que se sente quando estamos em queda-livre no sonho.

Depois de um tempo considerável perambulando pelo satélite, saltando crateras, chutando a poeira e vendo ela voar plasticamente lenta como se fosse num aquário, começou a concluir que estava sozinha nesse sonho, selecionou algumas pedras que achava mais aerodinâmicas (não que isso fizesse qualquer diferença sem a resistência do ar) e começou a atira-las em direção a terra, quem sabe a aceleração adquirida pelos pequenos pedaços de solo lunar não atingisse uma contagem tal que resultasse numa chuva de meteoros desastrosa, que atingiria a Terra causando uma catástrofe de proporções tais destruindo o planeta numa Supernova. Começou a por todas as suas frustrações naqueles pedregulhos, e olhe que eram muitos, todos em sua maioria direcionados a pessoas em específico ou pelo menos a coisas que as pessoas tenham feito ou dito que a faziam perder cada vez mais expectativa no futuro da humanidade, e no seu próprio futuro.

Para surpresa de Juliete, o efeito onírico que os projeteis pegaram no espaço causou exatamente a resposta esperada por ela, rastros de fogo cruzaram a escuridão, as estrelas se afastaram numa reação em cadeia, todas se digladiando e expandindo um pouco mais o infinito, como nos CG's do Discovery Channel, raios purpura e nebulosas explodiram, como se fosse aqueles desenhos divinos da via Lactea, alcançando distancias que cruzavam o horizonte do Universo. É claro, todo esse efeito chegou na Lua como uma descarga de peso atmosférico, e aquela sensação de falta de gravidade foi substituída por uma força fulminante que pregou o corpo de Juliete no chão. Pedaços de própria Terra cruzavam o horizonte e se perdiam no limbo sideral, passavam voando pelas laterais do satélite, e o próprio já começava a se deslocar forçadamente de sua órbita.

Durante o tempo que Juliete ficou presa ao solo assistindo o titânico acontecimento galático, ela sorriu, por ter a chance de presenciar uma das cenas mais lindas que sua imaginação poderia ter construído. Fechou os olhos e se deixou levar pela destruição.

Achando que tudo aquilo era um sonho, Achando que algum dia ela iria acordar.

sábado, 7 de agosto de 2010

Cotidiano Fantastico #3 : Sacola - a - Jato

O fotografo Richard encontrava-se em um ambiente inóspito de seu cotidiano. Era natural do ecossistema de duas paradas de ônibus acima, agora, interditadas pelo reasfaltamento da via principal, que desembocava em muitos outros leitos de asfalto não tão importantes assim.

Por um número incerto de dias, ele teria de andar um bocado de metros a mais na sua rotina para poder alcançar a parada mais próxima e, se conseguisse, pegar o ônibus no horário que o prendia toda manhã.

Fenômeno do acaso, por várias vezes perdeu seu ônibus e enfrentou a quimera de esperar o destino, sem nada poder fazer quanto ao motorista que quase dormia no volante do coletivo e o fazia atrasar mais ainda a vida.

Nessas esperas, muito lhe admirava a rotina do “homem do saco”, um mendigo que insistentemente cruzava a parada todo o dia, as vezes falando com o vento, apressado, as vezes lento, sentava, puxava conversa com alguem que realmente existia, insistia em ser ignorado até receber alguns trocados e ir embora.

Não era estranho pensar como seguia a vida dessa forma, se debaixo de cada viaduto existe um louco, o homem do saco devia ter debaixo de algum pedaço de via um lugar para dormir, devia peregrinar por todas as paradas da cidade fazendo sua performance, trocando lixo seja por dinheiro ou drogas, ou apenas a loucura de se achar dono dos restos do mundo o fazia continuar essa jornada de desprezo. Para todos os efeitos, era mais um equilíbrio da balança social, todos naquela parada de ônibus seguiam seu destino, mesmo que atrasados, e o mendigo também o fazia, isso que mantinha a normalidade dos acontecimentos cotidianos.

Na última noite do último dia de seu martírio, Richard subia a via principal, finalmente reformada, mas ainda interditada até a manhã do dia seguinte. Alguns vestígios da obra sobravam no asfalto mas, fora isso, via-se o deserto seguir dentro da noite, o tapete negro pintava-se de amarelo apenas pela interferência das luzes do poste e do semáforo.

Do nada, a falta de vida do espaço foi quebrada, como num Big Bang, um mendigo vinha cruzando o plano da rua vestido de sol, numa lona prateada por sobre o corpo que refletia todo amarelo da luz notívaga, e costurava a rua em seus detalhes: tampas de garrafa, anéis de latinhas de refrigerante, embalagens de salgados, bitucas de cigarro, restos de qualquer coisa que se podia achar na dimensão da cidade. Mesmo ao longe, Richard reconheceu a figura que se posicionava no centro da via deserta, trazendo sua Sacola enorme nas costas, puxou um capacete prateado debaixo do traje e fixou-o cuidadosamente na cabeça, cuspiu no próprio dedo, estendeu-o aos céus para sentir o tempo e embalou-se dentro do saco. Richard parou por um instante, puxou sua máquina fotográfica prevendo o fantástico, e por mais que fenômenos do acaso o prendessem ao atraso do cotidiano, o trabalho de sua vida era não perder esse tipo de oportunidade.

O tempo parou, ou pareceu ter parado, de repente surge de dentro do saco um homem de armadura metálica, uma carcaça de ferragem, alumínio, um motor de motocicleta , antenas de tv, fios de poste, canos de escape que saiam pelos seu ombros e desciam até encostar no asfalto. A máquina tremia e estrondava mas era um homem que dominava a gigantesca turbina, com uma proteção feita das moedas que colhia durante o dia, o “Homem do saco”, como um guerreiro “steampunk”, virou pesado 180° e encarou o fotografo, estendeu o polegar direito, uma saudação que revelou o gatilho de inguinação da nave.

Tudo trepidava, até o dedo de Richard na câmera, o asfalto recente começava a rachar, e o que ele temia era uma iminente explosão a desencadear tripas e metal voando por toda parte, mas ele tinha que confiar no seu instinto, ele tinha que apertar o gatilho na hora certa....e ele apertou...



O dia amanheceu, Richard vinha descendo o plano da rua pensando mais uma vez no atraso do ônibus. Com a lente da sua máquina quebrada tinha que arranjar dinheiro para voltar a ganhar dinheiro, ou arranjar outro emprego, provavelmente pedir ajuda financeira para o pai, que lhe diria para arranjar outro emprego, o que já era um clichê.

A inexplicável cratera formada no meio da via principal ia levar um tempo para ser restaurada, pessoas recolhiam os destroços que ficaram na rua e a duas paradas de ônibus dali, um mendigo carregava nas costas um motor de motocicleta, uns canos de escape, e um capacete amaçado debaixo do braço.

Na parada, Richard viu o “homem da sucata” atravessar o outro lado da rua, e imaginou como era previsível o destino do acaso.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Paraíba Cine Senhor: Cine Hq

Paraíba Cine Senhor: Galeria: "Desenho 'perdido' de Megaron Xavier antes da ida para São José de Espinharas:"



Esse era pra ser um trabalho de documentação via Quadrinhos do Projeto Paraíba Cine Senhor...eu fiz essa primeira edição mas a idéia acabou não indo para frente...tinha muito trabalho e estres extra para seguir a regularidade necesséria...quem sabe ano que vem :¬)

PS.: A menina do quadrinho é a apresentadora do "Cine Jornal" Silmara Braz



PSS.: Projeto Paraíba Cine Senhor

segunda-feira, 26 de julho de 2010

O Hospede Inconformado...

Olá !!

Hoje eu vou publicar uma parada bem tosca por aqui

Geralmente eu fasso muitos rascunhos e odeio finaliza-los, dai que eu tenho um monte de idéias rascunhadas esperando só um pouco de boa vontade da minha parte.

Então decidi deixar de frescura e juntar o Inútil ao Desagradavel...Está aí uma história rascunhada toscamente a uns 3 ou 4 anos atraz e que eu não sabia o que diabos fazer com ela...

Então decidi jogá-la no Photoshop pra ver o que acontecia, resultado....ficou uma droga, decidi então que a história realmente era uma droga e que nunca mais eu finalizo um rascunho tosco digitalmente de forma tosca, num programa que eu não sei mexer...

Apesar dos pesares, essa uma história extremamente intimista e densa... talvez nunca devese ter saido do rascunho afinal...Portanto eu não quis fazer uma coisinha bonitinha e profisional, até porque(Heloooo!!!)eu não sou profissional, muito menos bonitinho. :¬{

Enfim...vou tentar ficar no nanquim mesmo...






terça-feira, 20 de julho de 2010

Cachalote !!!


Você já sentiu aquela sensação de ser engolido pelo chão, devorado pelas paredes, cospido pelo teto, ou simplesmente você é claustrfóbico...?

Falando sério...sabe expressões como frio na espinha, borboletas na barriga, elefante na sala, todos conceitos abstratos para retratar sentimentos pesssoais ou sensações físicas de incomodo, prazer, medo, frustação. Não podemos esperar que nossos demonios se materializem,como nessas expressões, em uma grande massa cinzenta (we'll aways have Lost...not!), ou que um piano gigante caia na nossa cabeça, para que possamos desencadear uma guerra homérica contra nossas quimeras cotidianas.

Nada é tão simples como uma fábula, mas talvez as fábulas simplifiquem o caminho. As vezes a arte permite que nós possamos dar uma de Dom Quichote, e sair por aí caçando Moinhos de Vento para matar nossos Gigantes.
Cachalote é uma metáfora, a capa representa bem o desafiador mergulho que fazemos por suas páginas, são cinco histórias de ruptura que constroem um mosaico cuja única finalidade é evidenciar a besta grande e gorda que dorme tranquilamente nos sentimentos que não são vividos(uf...).


Na verdade, o desafio é quebrar o óbvio da história, o importante é o crescimento dos personagens e como eles reagem em frente ao abismo simbólico que passam. Pode ser que no final pareça não ter acontecido nada, e que tudo tenha sido uma grande enrrolação de 300 e tantas páginas, o natural é esperar que as histórias se completem da forma mais direta possivel, como num "crosover". O que acontece em "Cachalote" vai muito alem disso, é preciso mastigar as passagens para sentir a ligação que cada momento tem um com o outro, no final, não se vê a placa do caminhão que acabou de lhe atropelar, mas ele passou, e é preciso interpretar o 'nonsense' para poder entender o motivo da história. Se você já assistiu Magnólia você sabe do que eu to falando, se não.

O que chama atenção tambem na história é o constante diálogo com o fantástico, os acontecimentos que movem os personagens parecem vindos de um sonho. A própria arte traz algo onírico, nas suas linhas delicadas, tortas, meio confusas em certos quadros, mas com um expressionismo que transforma o cotidiano no surreal em um "passe de tinta". A história se inicia muito contemplativa até, um rítimo moroso, poucos quadros, dando enfase ao detalhismo na arte do Rafael Coutinho, mas a partir de um momento ganha velocidade, como se o leitor precisase completar o corte brusco entre as histórias, lendo o mais rápido possivel para saber o que rola no final, ou se vai realmente rolar alguma coisa interesante no final.



Cachalote é um mosiaco de vidro, espera-se que você quebre esse mosaico e veja o que há alem, espera-se que os personagens quebrem, façam a ruptura que suas vidas pedem naquele momento.
Existe sim uma enorme Baleia dentro da sala, ou você a esconde debaixo do sofá e vai assistir tevê, ou você vai hidratar suas escamas e devolve-la ao mar...

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Cotidiano Fantástico #2: Big-Bang

Nesse momento Richard encontrava-se parado, a despeito, é claro, do fato que o mundo girava e que, por intermédio de alguma força invisível, seus passageiros moviam-se com o mundo sem, por exemplo, perder-se no espaço sideral. A ciência pode até explicar e dar nome a essa força, mas a falta de deslocamento em que se encontrava Richard acontecia, talvez, por razões alheias a explicações cientificas.

Uma fila, aparentemente comum, poderia se tornar a alegoria da criação de um novo universo. Enquanto o “nada” acontece, um agudo sinal eletrônico indica o momento da revolução, um pequeno passo para frente, um grande passo para a humanidade e para a econômia mundial. A verdade era que Richard mantinha-se preso a sua condição de quase-inércia devido a uma questão monetária, queria pagar as contas atrasadas com seu suado dinheirinho de fotografo “freelancer”.

No entanto, o limiar que levava ele e todos os mortais contidos entre as linhas amarelas pintadas no chão, mostrava-se bastante tedioso. Talvez um grande Big - Bang fosse necessário a esse “microverso”, talvez se alguem pulasse as barras de segurança da Unifila e violasse sua autoridade suprema, um golpe de estado seria possível.

Para desgosto de suas fantasias revolucionárias, o centro gravitacional da fila ia alem das barras de organização que formavam os corredores imaginários e alem da necessidade individual de cada um. Aparte dessa estrutura existiam homens uniformizados, parrudos seguranças, que iriam fazer vista grossa a qualquer movimento não calculado. Isso, no minimo, causaria um enorme constrangimento em algum fura fila.

Mais um “beep”, mais um passo, e Richard sente sua massa sendo multiplicada pelo decorrer do tempo. Todos os dez minutos que perdera naquela realidade, agora o faziam se perder em qualquer detalhe visual, por mais estupido que fosse: o banner de propaganda da agencia bancária, o excesso de maquiagem no rosto da menina no caixa, a plaquinha de “não fume” no cantinho da parede e o joanete da senhora parada a sua frente, não...o joanete não, unhas carcomidas e esmalte roido.

O chão mal varrido só aparenta limpeza no odor perpetuo de desinfetante de Limão, como a via láctea, uma mancha que circunda as estrelas, é o rastro das fragrâncias que se misturam no ar, e num instante não há mais fragrância, não há mais cheiro, não há mais ar. O aglomerado de pessoas nesse cubículo catapulta Richard para fora da atmosfera, em direção ao sol, ou para fora da tranquilidade, com um ataque de pânico.

“Beep!”, mais uma vez, o sinal eletrônico alerta que o universo está em mudança. Enquanto a humanidade da um passo a frente na sua evolução, Richard adquire a incrível habilidade de voar e desprender-se das amarras gravitacionais daquele universo. Voara, sem peso nem massa, por cima das barras que delimitavam a fila, e para longe do olhar desconcertante do segurança de banco, que ligeiramente pôs a mão no coldre da arma e tentou manifestar sua força gravitacional, mas Richard já sumia porta a fora do banco, deixando a esperança num próximo Big – Bang.

sábado, 10 de julho de 2010

Long Play...

Ano passado participei de uma oficina de Quadrinhos ministrada por Shiko.

Aprendi um bocado de coisas sobre a produção de Hq's, traço, composição, e ainda tive que acompanhar uma galera com o nível artístico bem mais avançado que o meu.

Enfim...No final da oficina cada um teve que fazer uma história com o tema "Mulheres e Armas", uma história curta, algo bem desafiador para quem está començando.

"Long Play" foi o resultado desse desafio, É a minha primeira história que saiu do rescunho, primeira vez que finalizei com aguada de nanquim e vai ser publicada na "Revista Calango n 2º" (que vai sair se Deus quiser), junto com as outras histórias feitas na oficina.

Então fiquem ai com Long Play...e até o proximo post marujo!! :)








quarta-feira, 7 de julho de 2010

Faltou Água




De manhã me faltou água

Mais tarde vai faltar vida

À tarde, a cachaça faz falta

À noite, faz falta o dia


Reato o amor na madrugada

Pra requentar a boia fria

E a dor arrebatar a alma

Quando faltar água...noutro dia.

Cotidiano Fantástico #1: Propósito

Quando o marcador digital atingiu a casa de numero 3, o celular sabia qual o objetivo de sua existência naquele momento, não sabia porem quais seriam as implicações de sua ação, mas sabia que vinha a um longo período esperando por esse momento, passara a noite em claro na expectativa de uma funcionalidade real, a esperança de alertar uma ligação urgente, e agora dada sua deixa, a razão metódica que envolvia toda a sua vontade, estava prestes a desencadear o caos no mundo onírico.

- Alô.

- Não, não...o senhor ligou errado...

- Tá, chau...

Bruscamente acordado, e agora sem sono, Richard se perguntou quem diabos liga para pedir um galão de água mineral em plena madrugada.